Sono profundo
Escondes-te por entre as fracções súbditas do tempo, em cada segundo, em cada batida. Agarras os sons dos ponteiros dos relógios gigantescos do sítio onde não há tempo, para que eu te possa ver para sempre. Seguras-te bela e repousas em paz nos suspiros das horas que se vão, nos minutos que partem. Não os sentes passar na infinidade dos momentos a sós, dos momentos marcados e gravados em ti por cada um dos segundos em que respirei a teu lado. Despes os teus preconceitos em canções altivas e o desespero sumarento do teu amor faz-me acordar. Num sítio onde o tempo não passa, tu deixas-te ser minha para sempre. Corres nas estradas feitas pelas horas cansadas de correr pelos dias da vida, pelos caminhos do mundo. São as marcas do tempo que já não existe, que nunca, deveras, devia ter existido. Rasgas o tempo, o mundo larga-se em ti, e num momento eterno deixas-te cair no sono dos passeios infinitos. Dormes descansada onde ninguém além de mim te pode ver. O orgulho do deus tempo faz-se sentir nos soluços inconstantes do vento. Um vento que sopra sem pressa, sem força, sem tempo para morrer. Como poderias dizer adeus a alguém que jamais saberá o que é desaparecer no tempo, a alguém que viverá na eternidade de duas palavras, para sempre?
Agarras-te com força à minha pele nua, e rasgas em mim os segundos que perdemos na infinidade do espaço. Agarras-te na força do desconcerto mais profundo e arrancas-me o pulsar do sangue nas veias, para te poderes embriegar na ternura da paixão. Deixas a luz entrar na escuridão da imortalidade, e perdoas o tempo que já te marcou. Levas nas mãos, carregas nos ombros cada um dos suspiros dos minutos em que choraste por mim. Para sempre eu marquei o teu corpo, e para sempre tu levaste a minha alma. Para o sítio onde o tempo jamais existirá. Sempre existe na imensidão temporal da existência racional, mas não nas largas ondas do tempo sofrido a chorar... por amar. Soltas os beijos mais profundos de ti, e gritas ao vento o choro mais profundo da incompreensão. Então eu grito do outro lado do mar para me poderes ouvir. Gritos desgarrados por ti, que sofres além das barreiras de mim.A chuva cai intensa, nos sítios onde o tempo já não passa. Mantém-se suspensa em si, e deixa-nos passar por entre as suas cortinas frias. Então eu arrasto-me para perto de ti, e derramo em ti o meu olhar escuro. Encostas a tua cabeça perto do meu coração e sente-lo descontrolar-se no descompasso do tempo. O tempo já não existe. O tempo já partiu. Tocas-me a mão, e eu estremeço em ti, tu aqueces-me a cara fria, e eu caio para ti. Quebras as prateleiras que seguram os vasos vazios do tempo, e tiras de ti o limiar da tua existência. Dobras-te sobre mim, e eu sucumbo ao poder do teu olhar. Tocas-me mais uma vez, e na incongruência do tempo que passou, eu saberei que para sempre, em ti, eu existirei.
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